Sonata de Outono e a Relação mãe e filha
- alexandra machado
- 5 de fev. de 2015
- 3 min de leitura
Continuando no assunto da relação entre mãe e filha, segue uma análise sobre o filme Sonata de Outono, onde dá para ver o quanto essa relação pode ser devastadora para um sujeito, principalmente para uma mulher.

A RELAÇÃO MÃE E FILHA EM SONATA DE OUTONO
Alexandra Machado.
A partir do filme Sonata de Outono, do autor sueco Ingmar Bergman, no presente trabalho, será articulado com as questões do feminino na visão da Psicanálise.
O filme trata de um drama, sendo seus diálogos carregados de poesia e simbolismos, trazendo como componente o feminino, retratado pelos personagens Charlotte, a mãe e, a filha, Eva. Marcado por uma relação dolorosa e devastadora, no qual o filme aborda, sendo abordado por uma relação entre duas mulheres, na aparente relação familiar entre mãe e filha.
Charlotte, uma mulher que se tornou uma pianista consagrada, que no entanto, para isso fez-se ausente na sua função familiar tanto como esposa quanto como mãe. Ou seja, uma artista completa e uma mãe faltosa são caracteristicas desse personagem. Já Eva, uma mulher de aparência e gestos infantis, olhar melancólico, carregados de mágoas guardadas de uma infância marcada por um amor incondicional e um ódio proporcionalmente grande por sua mãe. É justamente a intensidade do amor e do ódio sem limites entre mãe e filha que trata esse filme.
Com a fala de Eva, em que me chamou atenção por ser um aparente enigma, a saber: "Meu maior obstáculo é não saber quem sou..", aponta o enigma sugerido por Freud ao não-sber histérico e à dificuldade de definição da mulher sobre sua identidade feminina, isto é, a ausência de algo ou alguém que lhe diga o que é ser uma mulher. Denuncia também essa questão da personagem, escrito por ela em seu livro, a ausência de lugar diante do desejo do Outro, a saber, esse Outro materno. Visto essa ausência de lugar novamente na carta em que Eva manda à sua mãe, numa suplência ao seu retorno, após sete anos de separação. Eva, a partir de várias tentativas frustradas de sensibilizar e se mostrar merecedora do amor da mãe, no qual precisa ser afirmado o tempo todo de tão superficial que é, dá inicio ao acerto de contas entre elas, onde Eva acusa o tempo todo Charlotte de tê-la deixado e, também a sua irmã.
O que se mostra no filme é uma ambivalência na relação mãe e filha, como segundo Freud em seu texto A Sexualidade Feminina 1931, sugere que essa relação é regra nas primeiras fases da vida erótica, apontando uma dificuldade da filha em separar-se da mãe, no qual é um aspecto crucial para o desenvolvimento da sexualidade de uma mulher. A fase de ligação ou
amor exclusivo da filha à mãe, Freud denomina como fase pré-edipiana, que tem para a mulher uma grande importância, uma vez que é nessa relação em que a menina poderá encontrar uma identificação feminina. No qual pode-se ver refletido na escolha que Eva faz por seu marido, isto é, um homem a quem nunca amou, embora sempre esteve ao seu lado, no entanto na espera de ser um pouco amado. Escolha essa refletida ao modelo do seu pai, repetindo assim a relação que era vivida por sua mãe na relação conjugal. Nota-se que a função paterna não foi efetivada já que não há um corte na relação mãe e filha. Essa função paterna depende de ser efetivada pelo desejo da mãe e de sua permissão à esse corte, reconhecendo-o como a lei. Porém, o pai de Eva, aparece como submisso, no qual junto com sua filha compartilhava da solidão da ausência de Charlotte, sustentando assim a posição da mãe para a filha comotoda fálica, resultando para Eva a insuficiência de seu lugar de mulher. Embora para Freud (1931), a relação da menina com o pai não faz desaparecer a relação primária de amor com a mãe. Percebe-se nitidamente isso na relação que a personagem tem com o pai, uma relação muito mais baseada na cumplicidade devido a ausência da mãe/esposa, do que um direcionamento ao pai como substituto do amor da mãe enquanto primeiro objeto de amor. Seria exatamente essa substituição ao amor da mãe que permitiria a menina encontrar o caminho para a feminilidade. Trocando de objeto de amor, aceitando a castração e abdicando o objeto desejado, isto é, o pênis pelo desejo de um filho.
Ao contrário disso, é visto no filme, Eva colocando-se como objeto de satisfação de sua mãe, apresentando dificuldade em renunciar à esse lugar de gozo. Em outras palavras, a menina ao tentar tornar-se objeto de gozo materno, deixa suspenso o seu próprio desejo.
Referência Bibliográfica
FREUD, S. Sexualidade feminina, 1931. In: O Futuro de uma Ilusão, o Mal-Estar na Civilização e outros trabalhos, vol. XXI. Rio de janeiro: Editora Imago, 1996.
LACAN, J. O Seminário, Livro 4, A relação de objeto (1956-1957). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1995.
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